Do samba à inteligência artificial: o Carnaval 2026 já começou e o Spotify vive uma revolução digital
Uma reflexão sobre a importância das disputas de samba-enredo, a polêmica dos artistas de IA no Spotify, 30 anos de Liniker e muito mais!
💭Opinião - Spotify, IA e artistas virtuais: o que está por vir?
Na última semana, o assunto mais comentado no mercado musical foi a reportagem da Music Business Worldwide sobre “artistas” de inteligência artificial conquistando milhões de plays no Spotify. Segundo a matéria, esses “grupos” e “cantores” virtuais não só acumulam audições expressivas, como também receberam o selo de verificado e passaram a figurar em playlists oficiais da plataforma.
Perfil do grupo criado por IA “The Velvet Sundown” no Spotify (Fonte: Spotify)
À primeira vista, o cenário parece saído de um episódio de Black Mirror. O que realmente me chamou a atenção, porém, foram as implicações financeiras e como isso pode afetar a dinâmica para artistas de carne e osso. Hoje, a divisão de royalties no Spotify já favorece nomes com números massivos de audições Taylor Swift, por exemplo, recebe muito mais que um artista independente no Brasil.
Até aí, nenhuma grande novidade. A diferença é que esses projetos de IA podem lançar dezenas, talvez centenas, de faixas em questão de dias, tornando a fatia do bolo ainda menor para quem não tem algoritmos a seu favor. Mais que isso: não seria surpresa se grandes gravadoras começassem a introduzir seus próprios “artistas” de IA. Na verdade, o procedente já foi aberto por Timbaland, um dos grandes nomes da cena musical dos EUA.
A matéria assinada por Tim Ingham, que comentei no início do texto, parece arranhar apenas a ponta do iceberg. Honestamente, não acredito que o Spotify e as demais plataformas tomarão providências para proibir essa produção de IA. No entanto, é provável que a classe artística pressione por novas dinâmicas de remuneração ou distribuição de royalties.
Foto do perfil do cantor criado por IA “Aventhis” no Spotify (Fonte: Spotify)
Em um cenário no qual a teoria da Internet morta ganha cada vez mais popularidade, fica a pergunta: a música será o próximo campo a ser dominado por bots? Ainda é cedo para afirmar, mas uma coisa é certa: os artistas precisarão se mobilizar e repensar suas estratégias de distribuição e geração de receita.
💭Opinião - A disputa de samba enredo e a importância para além da Sapucaí
Quem é ligado em escola de samba sabe que o Carnaval do ano seguinte começa já na quarta-feira de cinzas. A preparação de um desfile é algo intenso, demorado e que requer muito trabalho. Mas eu particularmente acho que o principal marco simbólico do novo ciclo é a disputa de samba, mais até que o próprio anúncio do enredo.
Como o próprio nome diz, é escola de samba. É o samba que rege a festa, é a música que faz o desfile acontecer, ele que narra a história contada. Por isso, a importância dada a escolha do samba enredo é um elemento crucial para o carnaval. Um samba, por melhor que seja tecnicamente, pode ser um fracasso retumbante na avenida se não for apoiado pela comunidade. O chão precisa comprar o samba para que ele aconteça na Sapucaí.
Salgueiro, em 1993, trouxe o icônico samba “Explode coração”, que é lembrado até hoje e que na época era tido como um samba “fraco” até fazer a sua magia na avenida (Foto: André Pinto/ O Globo)
Por isso, acompanhar a disputa de samba é uma experiência única. Estar na quadra e ver o samba acontecer com os presentes é algo que você simplesmente sente. Por mais que digam que a história é contada pelos vencedores, no caso da disputa em quadra eu digo que a história é contada pela trajetória.
Não vou ser ingênuo e dizer que não há um jogo por trás da disputa, que grandes figurões e os chamados escritórios de samba enredo não tenham seu peso, afinal, é uma disputa e como qualquer outra a competição tem seus contornos políticos. Mas ainda assim há um caráter quase ritualístico nesse processo e que serve para reforçar os laços identitários que as agremiações criam com suas comunidades.
Calendário das finais de samba-enredo das escolas do grupo especial (Fonte: Rio Carnaval)
Por isso, com o anúncio da abertura da disputa de samba (com a final já marcada), eu decreto que o Carnaval 2026 começou de verdade.
Efeméride - 30 anos de Liniker
No último 3 de julho, Liniker completou 30 anos. A cantora, compositora e atriz paulista é uma das figuras mais potentes da música brasileira contemporânea, não apenas pela voz marcante, mas também pela forma como ocupa espaço com sua arte e identidade.
Liniker em foto para seu aniversário (Fonte: Liniker / X/Twitter)
Com um som que une diversos gêneros como MPB, R&B, samba e soul, a cantora apresenta letras potentes e muito autorais. Desde sua fase com Os Caramelows, ela vem colecionando reconhecimento de crítica e público, consolidando-se como um dos grandes nomes da nova geração.
O álbum solo Indigo Borboleta Anil (2021) marcou um ponto de virada. O disco não só reafirmou seu talento e amadurecimento artístico, como também a levou a fazer história como a primeira artista transgênero a ganhar um Grammy Latino.
Seu mais recente trabalho, Caju, é outro sucesso. Canções como “Veludo Marrom”, “Caju” e “Tudo” são alguns dos sucessos do disco, enquanto a sua turnê se tornou uma das mais disputadas no circuito nacional. Um documentário sobre a obra está em desenvolvimento e, em setembro, Liniker comemora 1 ano de Caju no festival Doce Maravilha, no Rio de Janeiro.
Elza Soares, Milton Nascimento, Criolo, Péricles, Pablo Vitar são apenas alguns dos tantos nomes com quem a cantora já dividiu estúdios e palcos. Suas parcerias refletem o respeito e a admiração que conquistou na cena musical.
Entendendo a importância da arte como ferramenta política, Liniker também tem uma trajetória marcada sobre seus posicionamentos fortes. A causa trans, questões étnico-raciais e a busca por justiça social são motes da sua presença pública.
Aos 30 anos, Liniker já tem uma carreira consolidada e, ao mesmo tempo, a sensação de que ainda há muito mais por vir. Prova disso é a carta aberta publicada em seu perfil do instagram no dia do seu aniversário.
👂🏻Com o ouvido atento
Um apanhado sonoro da semana: o que ouvi, gostei e recomendo.
[ÁLBUM] . (Period) - Kesha: Primeiro álbum independente da Kesha, só por isso já vale uma conferida. Mas gosto de como ela experimenta mais as sonoridades com o pop. “JOYRIDE.”, “FREEDOM.” e “DELUSIONAL.” são alguns dos destaques.
[ÁLBUM] Até a última rima - Jotapê e Papatinho: Jotapê não estava brincando quando diz que fez sua voz virar uma arma. “Leandro Roque” (com feat do Emicida), “O legado de Pryor” e Virgil (com feat de GNÃO) são alguns dos destaques.
[SINGLE] Today’s Song - Foo Fighters: Uma espécie de musica tributo da banda para a sua história e colaboradores. Não me pegou tanto, mas reconheço que tem o seu valor.
[SINGLE] Mad - Reneé Rapp - Renné Rapp já vem galgando seu espaço na cena pop dos EUA e o single “Mad” é mais um indicativo de que 2025 pode consolida-la como grande artista. Olho nela.
[SAMBA ENREDO] Samba 7 - Estácio de Sá (Alexandre Naval e Parceiros): Da leva da Estácio, foi o meu preferido na versão gravada. O que diz muito dada a competição cheia de nomes pesados para 2026.
🖇️Clipping da semana
Um resumo do que li, ouvi e vi sobre música nos últimos dias!
📰The AI music problem on Spotify (and other streaming platforms) is worse than you think [Music Business Worldwide]
📰Lana Del Rey and the triumphant anti-stadium show experience [The line of best fit]